Jornal O Povo - Caderno Vida & Arte - Fortaleza-Ceará


Sexta-Feira, 5/01/2001

O retorno de Ednardo

Luciano Almeida Filho
Da editoria do Vida & Arte

Depois de nove anos do disco ao vivo, Ednardo retorna com Única Pessoa, que traz uma parceria dele e Chico César na faixa-título. O cearense ainda interpreta canções de outros autores de diversas origens.

Há 28 anos, Ednardo foi um dos responsáveis pela revelação da geração de artistas cearenses que ficou conhecida como `Pessoal do Ceará'. Ao lado de Raimundo Fagner e Belchior, formou a tríade de cantores/compositores de maior sucesso do Ceará. Nesta virada de milênio, o cantor e compositor cearense Ednardo resolveu tirar da manga sua mais nova cartada: o CD Única Pessoa (GPA Music/ Ouver Records), que acaba de chegar às lojas.

Há nove anos sem lançar disco - o último foi o LP Rubi - Ednardo Ao Vivo -, Ednardo fez a opção de não lançar um trabalho novo. Ele fez questão de adiantar que teria bastante material para isso, pois tem cerca de 80 composições - seu último trabalho inédito foi Libertree, de 1984. Durante este período, Ednardo escreveu três trilhas sonoras, que permanecem fora de catálogo, e não parou um só minuto de fazer shows por todo o País.

Para o novo CD, o cearense de 55 anos escolheu fazer um disco de intérprete, que reúne composições de diversos autores, entre os quais alguns conterrâneos, como seus irmãos Régis e Rogério Soares, e Chico Pio, resgatou uma parceria de Lauro Maia e Humberto Teixeira, entre regravações de monstros sagrados como Milton Nascimento e Chico Buarque. O disco traz apenas uma composição de sua autoria, justamente a faixa-título, ``Única Pessoa'', que marca o início da parceria Ednardo e Chico César.

O paraibano radicado em São Paulo é um dos nomes da geração anos 90 da MPB que mais cita Ednardo como influência musical na sua carreira. ``Fui ver um show do Chico César no Canecão, aqui no Rio de Janeiro, e gostei bastante. Depois fui cumprimentá-lo no camarim e ele me recebeu muito bem, começamos a conversar e vimos que tínhamos muita coisa em comum''. Assim Ednardo explicou como nasceu a parceria que, segundo ele, ainda deverá render outras.

``Única Pessoa'' também serviu de fio condutor para a escolha das outras composições do disco. Assim, o novo CD reúne canções que falam basicamente de amor, nas visões mais diversas dos diferentes letristas/poetas e compositores escolhidos. Em entrevista ao Vida & Arte, por telefone, direto de seu escritório no início da histórica rua Nascimento Silva, no bairro de Ipanema, Rio de Janeiro, Ednardo comentou o CD Única Pessoa, faixa por faixa, explicando o porquê da escolha das composições, como conheceu seus autores, fazendo ligação com o conceito do projeto.

ÚNICA PESSOA - Mais recente disco do cantor e compositor cearense Ednardo. Participação especial: Belchior. Produção: Guti Carvalho. Lançamento GPA Music/Ouver Records em CD. 12 faixas.

Única Pessoa por Ednardo

FOLIA OU PRESSA (Clésio Ferreira/ Augusto Pontes) "Eu produzi em 77 o disco dos irmãos Climério, Clodo e Clésio, chamado São Piauí pela RCA (atualmente BMG Brasil). Eu estava num momento onde podia chegar para o pessoal da gravadora e dizer: `olha, prestem atenção, esses compositores são interessantes'. Desde esse tempo, passei a gostar, admirar e curtir as músicas deles. Augusto Pontes dispensa apresentação, é um grande mestre cearense que sempre tem participado de todos os movimentos de teatro, de música, de cinema, enfim... Então esta música era uma das que estavam naquele disco e eu escolhi para entrar neste, porque ela é muito alegre''.

PEDRA DA LUA (Rogério Soares) "Rogério é um grande compositor, lançou um disco com o Régis, o Litoral. É uma pessoa muito musical, tem parceiros muito legais, muito incríveis''.

SINAL DOS TEMPOS (Bebeto Alves/ Totonho Villeroy) "Compositores do Rio Grande do Sul... Eu os conheci em 82, mais ou menos, na época que fizemos lá o Cio da Terra, um movimento muito parecido com o Massafeira. Quando meu produtor (Guti de Carvalho) me apresentou essa música, achei que ela tinha tudo a ver com o espírito do disco''.

DA MINHA TERRA (Nilson Chaves/ Jamil Damous) "São compositores do Pará, super respeitados na região, vendem muitos discos, são muito queridos pelo público local. Estou mostrando que existem pessoas maravilhosas em todos os lugares''.

NOCHE DE RONDA (Maria Tereza Lara) "Ela é descendente de Agustín Lara, daquela região afro-cubana, dos boleros, do Caribe, que não podia faltar no disco, pela percepção que o Brasil tem que ter em relação à América do Sul e América Central. Também pelo fato de ela ser uma mulher compositora, que tem uma sensibilidade incrível''.

POEMA IMORTAL (Lauro Maia/ Humberto Teixeira) "Humberto Teixeira, o mestre do baião... Na minha época de criança, vi uma vez a Orquestra de Lauro Maia na Ceará Rádio Clube. Achei interessante colocar o `Poema Imortal' porque não era o tipo de música com o qual eles foram reconhecidos. Inclusive eu tinha gravado esta música para o disco 80 Anos de Lauro Maia, produzido pelo Calé Alencar''.

AVE DE ARRIBAÇÃO (Javier di Mar-y-Abá) "Javier de Mar-y-Abá, o Xavier Santos, mora no sul do Pará. Ele toca nesta aflição do amor humano de uma maneira muito legal, ao mesmo tempo resgata aquela força que cada pessoa tem de não deixar seu coração perder a luz".

UNIVERSO EM MIM (Régis Soares/ Chico Pio/ Neudo) "Neudo: um letrista novo e super talentoso. Chico Pio: estava faltando alguém gravar, ele é fenomenal. E o Régis Soares também. Faço questão de mostrar que existem estas pessoas. Chico Pio já tem mais de 20 anos de estrada e grande parte do Brasil não conhece, não conhece Régis, Rogério, Neudo... Acho legal dar o toque porque este disco está sendo distribuído no Brasil inteiro''.

DITA (Antônio Cícero/ Orlando Moraes) "Aqui a gente já vem para a parte do Rio com Antônio Cícero, que é um grande poeta, irmão da Marina Lima, pensador e filósofo. E Orlando Moraes, um músico sensacional lá de Goiás, que também mora aqui no Rio, casado atualmente com a Glória Pires. A letra desta música fala uma coisa que eu achei fenomenal: `qualquer poema bom provém do amor'''.

FRUTA BOA (Milton Nascimento/Fernando Brant) "A frase `coração é o quintal da pessoa', eu acho o máximo! Foi um momento de felicidade muito grande de Fernando Brant quando escreveu a letra e também da música de Milton. Eu acho lindo! Essa coisa da pessoa descobrir também através da parte mais `fragilizada' ou emocional do ser humano. Hoje em dia todo mundo fala muito da inteligência emocional. A gente vê ainda muitas pessoas pensando que inteligência é somente a inteligência cerebral''.

FUTUROS AMANTES (Chico Buarque) "Chico Buarque é um gênio. Dispensa apresentar ou falar dele porque é um compositor que sempre tive vontade de gravar. E encontrei esta oportunidade agora, principalmente dentro do fio de condução desse disco. É uma música que fala desta coisa humana que nós temos, o amor. Ela pode passar milênios e milênios que as pessoas vão se amar e vão entender o que esta música está falando".

ÚNICA PESSOA (Ednardo/ Chico César) "Esta música que dá um entendimento geral do que significa o disco. Ela conceitua o disco, fala de uma única pessoa. E, ao mesmo tempo, ela fala que única pessoa somos nós. Nós dois, nós três, nós quatro, nós mil, nós milhares e milhões. A letra quem fez fui eu e a música foi o Chico. Ele falou: `vou fazer um maracatu em sua homenagem'. E eu falei: `vou fazer uma letra em sua homenagem, Chico, porque a primeira vez que te vi, eu também tive a sacação que você pensa muito parecido comigo em muitas coisas'. Então este disco é uma homenagem a Chico César e todos os compositores e ao pensamento deles''.

VOLTAR