CINEMA

EDNARDO: A MÚSICA PARA MIM É CINEMA

Irlan Rocha Lima

Jornal CORREIO BRAZILIENSE-DF 1985

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Praticamente, desde o começo de sua carreira, no início da década de 70, que Ednardo sempre vem a Brasília, toda vez que há um lançamento de um novo disco seu. Agora, embora tenha um trabalho novo sendo lançado, o disco "Libertree", o cantor está na cidade, mas não para fazer um show.

Autor da trilha musical do filme "Tigipió" de Pedro Jorge de Castro, um dos fortes concorrentes na mostra competitiva do XVIII Festival de Brasília do Cinema Brasileiro, e nessa qualidade é que Ednardo falou para o Correio Braziliense:

Como foi o processo de criação da trilha musical de "Tigipió"?

"Para fazer esta trilha eu acompanhei parte das filmagens, lá em Itaiçaba no Ceará, antes o Pedro me deu a sinopse e a gente conversou várias vezes a maneira de achar os espaços musicais dentro do filme, e a maneira como algumas músicas e letras iriam sugerir a montagem de partes do filme".

"Porque música e cinema são duas formas muito interligadas de arte, que contêm cenas, imagens, ritmos de narração, no que a música virtualmente sugere ou objetivamente diz, o cinema complementa e dá uma nova dimensão".

"Como a temática deste filme, é um romance dentro do circunstanciamento da seca, tem aí duas coisas básicas: um relacionamento de amor entre um homem e uma mulher e toda uma situação no contexto regional".

Sendo a temática do filme no contexto regional, a música abre uma fresta para um universo mais amplo?

"Uma parte da música instrumental da trilha é bem dentro do contexto, no que ela sugere arquétipos musicais, mas a partir da temática regional, abri a possibilidade de uma tradução universal, porque em si, o fenômeno da seca, é um circunstanciamento. E o que fica claro na música que realizei para o filme, é a transação do relacionamento humano naquela realidade, naquele quadro de dificuldades de uma região que pode ser em qualquer lugar, aqui no Brasil ou no mundo.

O seu interesse pelo cinema, pelo fazer cinema, vai até a criação de uma trilha musical ou transcende a este trabalho?

"Na realidade, rapaz, a música para mim já é um cinema. Existe na temática das músicas, a realidade humana, os sonhos, todas as abordagens e traduções, aquele algo que sugere coisas cinematográficas. Na passagem entre eu menino e adolescente, assistia três quatro filmes por final de semana, naquele tempo a TV não tinha chegado ao nordeste do Brasil, em contra partida, cada bairro de Fortaleza, tinha uma sala de cinema com programações diferentes, eu ia a todas, saia de uma sessão e assistia outras, e para mim era uma viagem entre as músicas dos filmes e as cenas das histórias que eles contavam. "Em 78, fiz o roteiro e dirigi, fiz a fotografia, música e produção do filme Cauim, em 16 mm. , preto & branco, ensaio ao vivo - chapliniano modo de fazer cinema, mostrei este filme como um audiovisual junto aos shows de lançamento do disco Cauim também originado neste período como extensão do filme. São coisas que o cinema me dá como observador e demonstra em sua riqueza e generosidade as diversas nuances de interação entre as duas formas de arte. Muitas outras músicas minhas quero fazê-las e transformá-las em cinema".

Inclusive em um dos seus primeiros discos, você gravou a música "Dorothy Lamour", que revela essa paixão pelo cinema e seus mitos.

"O universo de situações artísticas que o cinema sugere, com suas imagens e sons, me permite um bom trânsito nestas áreas, além de gravar a música "Dorothy Lamour", eu fiz "Como Era Gostoso Meu Inglês", uma abordagem bem humorada da junção do filme de Nelson Pereira dos Santos com os Beatles, a visão fotográfica urbana de "Alfa Beta Ação", e também as densidades musicais cheias de visões cinematográficas de "Cauim", "Arraial", "Pelo Coração do Brasil", "Tudo", "Agrestes Blues", "Alazão", "Boi Mandigueiro", entre muitas outras, quase sempre coloco em meus discos, músicas que sugerem coisas de cinema, cenas do cotidiano e também coisas transcendentais - Um cinema transcendental". Ó

Pesquisa Condensada Aura Edições Musicais - 2000

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